Jabaculê – Wikipédia, a enciclopédia livre
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Jabaculê, ou simplesmente jabá, é um termo utilizado na indústria da música brasileira para denominar uma espécie de suborno em que gravadoras pagam a emissoras de rádio ou TV pela execução de determinada música de um artista.[1][2]
Não se sabe exatamente a origem do termo. Uma das versões seria a que um radialista nordestino, ao receber uma certa quantia de uma gravadora, teria dito que "hoje o jabá das crianças tá garantido", sendo jabá um termo comum na região para a carne-seca.[3]
A prática não é exclusivamente brasileira; nos Estados Unidos (onde ela é conhecida como "payola"), nos anos 1920, donos de editoras musicais pagavam orquestras e líderes de grupos musicais para que executassem certas peças e incentivassem a compra das respectivas partituras que, na época, rendiam mais do que discos.[2]
O termo payola é uma combinação de "pay" (pagamento) e "ola", que é um sufixo de nomes de produtos comuns no início do século 20, como Pianola, Victrola, Amberola, Crayola, Rock-Ola, Shinola ou marcas como a fabricante de equipamentos de rádio Motorola.[4]
Nos anos 1950, com a explosão do rock and roll, a prática também se expandiu e levou o governo do país a abrir uma investigação que envolveu, entre outros, o disc jockey Alan Freed e o apresentador Dick Clark.[5]
No final dos anos 1970, a despeito das investigações do governo, o payola atingiu um ponto em que um grupo ligado à máfia conhecido simplesmente como The Network ("A Rede") surgiu e passou a controlar centenas de rádios nos Estados Unidos.[6]
O poder da organização era suficiente para barrar até a execução de faixas de The Wall, um dos álbuns mais bem-sucedidos do Pink Floyd. Em antecipação a cinco shows que o grupo inglês faria em Los Angeles durante a turnê, a CBS não achou que precisaria pagar para que canções de um disco tão popular de uma banda tão conhecida fossem executadas, mas o poder d'A Rede prevaleceu e as canções só apareceram nas rádios depois que a empresa se rendeu ao payola.[7]
O payola podia vir na forma de jantares, viagens, drogas, prostitutas, carros e até jatinhos.[8]
Fora o jabá propriamente dito, a indústria fonográfica brasileira já foi palco de outras práticas consideradas peculiares, como a compra de composições, isto é, músicos que compravam canções escritas por outros músicos e as lançavam como se fossem deles. A esses compradores, deu-se o nome "comprositores".[9]
Embora já existisse desde muito tempo antes, o jabá foi "profissionalizado" no Brasil na virada dos anos 1970 para os 1980;[2] gravadoras grandes como a Phillips/PolyGram viam suas vendas despencarem repentinamente por não aderirem à prática.[10]
O jabá nem sempre era pago em dinheiro; uma variação denominada "jabá artístico" envolve a entrega de presentes a radialistas que executassem certas canções,[10] ou brindes para sortear.[8] O pagamento às vezes era realizado também em drogas e até mulheres.[11] Ele acontecia também na televisão, por meio de apresentações gratuitas que os músicos realizavam em programas de Chacrinha e Bolinha.[10] Segundo Nelson Motta, algumas rádios chegaram a extinguir seus departamentos comerciais para focar apenas nos jabás.[8]
A prática foi criminalizada em 2006 pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados do Brasil, estabelecendo penas que variam de multa a detenção de um a dois anos, além da cassação da emissora que receber o dinheiro para colocar uma música no ar.[1]
“ | "A canção, e não mais o disco inteiro, tinha que ter começo, meio e fim, e se transformar num 'jingle da vida' durante os três minutos de sua existência...
Todas as estações de rádio foram obrigadas a tocar a mesma música, 'música de trabalho', e o preço do jabá foi à estratosfera." [12] |
” |
-- Andre Midani, 2008.
A utilização do termo abrange toda situação que envolve gorjetas, propinas ou qualquer tipo de dinheiro pago em troca de favores ilícitos, entre eles:
- Compra de um determinado número de execuções diárias de uma determinada música nas emissoras de rádio;[1]
- Compra de posições nas paradas musicais das emissoras de rádio;[1]
- Compra de espaço para apresentação de artistas em programas de auditório;[13]
- Aliciamento de jornalistas para obtenção de comentários favoráveis.[14]
Referências
- ↑ a b c d "Comissão aprova lei que torna o "jabá" um crime" - Folha Online, 30 de novembro de 2006 (visitado em 2-7-2010).
- ↑ a b c Barcinski 2014, p. 162.
- ↑ Barcinski 2014, p. 167.
- ↑ «payola | Search Online Etymology Dictionary». www.etymonline.com. Consultado em 6 de março de 2022
- ↑ Barcinski 2014, pp. 162-163.
- ↑ Barcinski 2014, p. 163.
- ↑ Barcinski 2014, p. 163-164.
- ↑ a b c Alexandre 2013, p. 375-376.
- ↑ Barcinski 2014, p. 164.
- ↑ a b c Barcinski 2014, p. 165.
- ↑ Barcinski 2014, p. 166.
- ↑ MIDANI, André. Música, ídolos e poder: do vinil ao download. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira S.A., 2008. pp.217-218
- ↑ "E havia o lado sombrio do Velho Guerreiro..." - Estadão
- ↑ "Preço do silêncio da imprensa é um mensalinho de até R$ 60 mil" - Observatório da Imprensa, reproduzindo matéria da Folha do Amapá
- Alexandre, Ricardo (2013). Dias de Luta: O rock e o Brasil dos anos 80. Porto Alegre: Arquipélago. ISBN 978-85-60171-39-2
- Barcinski, André (2014). Pavões Misteriosos — 1974-1983: A explosão da música pop no Brasil. São Paulo: Editora Três Estrelas. ISBN 978-85-653-3929-2