Casa de Agra - Círculo de Arte e Recreio
- ️Wed Jan 29 2025
Casa de Agra em Guimarães
Guimarães é uma cidade com um rico espólio patrimonial construído, de reconhecida qualidade cultural.
São inúmeros os edifícios, recantos e valores aos quais é reconhecida uma vontade pública de preservação, frequentemente concretizada quer através de atitudes de defesa por parte da comunidade, quer em deliberações municipais ajustadas às necessidades.
Atualmente, o trabalho de restauro e recuperação do núcleo da cidade intramuros é amplamente reconhecido pelo seu prestígio, e a sua qualidade tem sido impulsionada para concorrer ao título de Património Mundial.
No entanto, ainda existem outras zonas da cidade que merecem uma intenção claramente definida e orientada para a sua defesa e preservação. Entre estas encontra-se a zona de Santa Luzia.
Situada na antiga estrada medieval Guimarães-Braga, a Casa de Agra integra-se num antigo conjunto arquitetónico urbano dos séculos XVIII e XIX, de considerável valor, com tradições etno-culturais que se destacam:
As residências de ilustres vimaranenses ao longo das diferentes épocas, como o Visconde de Santa Luzia, o republicano Ribeiro de Freitas e o médico humanista Mário Dias, entre outros;
A Capela de Santa Luzia, situada em frente à Casa de Agra, onde se realiza uma romaria original no mês de dezembro, em louvor da protetora dos cegos e madrinha das brincadeiras namoradeiras de jovens: “a romaria dos sardões e das passarinhas”;
A Capela do Picoto, situada no alto do escadório do Picoto, dedicada ao Senhor dos Aflitos, originalmente pertencente à Casa de Agra. No início do século XX, passou à guarda dos ainda residentes na Viela do Picoto. No século XVIII, os devotos realizavam, na altura dos Santos, uma romagem com ladainhas;
A Queima do Judas, uma representação popular organizada pelo Círculo de Arte e Recreio no Largo de Santa Luzia. Este é um exemplo, entre outros, de iniciativas culturais promovidas por instituições e associações, com o objetivo de dinamizar turisticamente e culturalmente os espaços urbanos da cidade;
Diversas instituições foram, ao longo do tempo, instalando-se nesta rua, como a Delegação Escolar, a Associação de Professores do Ensino Básico, a Associação dos Antigos Alunos, a Escola de Ensino Artístico Árvore, o Sindicato dos Químicos, o Núcleo 25 do CNE, a Igreja dos Redentoristas, o Centro de Recolhimento de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e, ainda, o Círculo de Arte e Recreio.
O Senhor Francisco “Agra”
O proprietário da Casa de Agra, sita na Rua de Santa Luzia, era Francisco Ribeiro Martins da Costa, geralmente conhecido por Francisco Agra.
João Franco, seu correligionário político, refere-se a ele nos seguintes termos:
“Chefe de política local, as suas grandes demandas, as suas grandes batalhas, pelejou-as sempre em nome da terra que lhe fora berço (…). As nossas primeiras relações recordam o tempo em que alcançava, de Fontes Pereira de Melo, a colocação de um regimento e a organização de uma escola industrial na cidade de Guimarães. Depois, e sucessivamente, vieram a questão da autonomia municipal, o restabelecimento da Colegiada, a sua transformação em liceu, a construção das avenidas (…).”
A Casa de Agra era um local de passagem obrigatória para os influentes políticos locais, regionais e nacionais. Nela chegou a pernoitar o Presidente Marechal Carmona, aquando da sua visita a Guimarães.
Francisco Agra nasceu a 3 de julho de 1835 (dois anos mais novo que Martins Sarmento e, portanto, seu contemporâneo e amigo). Matriculou-se em 1852 no 1.º ano de Filosofia e Matemática na Universidade de Coimbra, mas foi impedido de prosseguir os estudos por motivos de saúde
Tornou-se amplamente conhecido ao fundar o Banco de Guimarães, em 1872, uma instituição de crédito de excecional relevância em todo o Norte.
Mais uma vez, transcrevemos João Franco:
“Entrei em 1884, pela primeira vez, na Câmara dos Deputados com o apoio de Francisco Agra sob a égide poderosa, e para os regeneradores de então quase augusta, de Fontes Pereira de Melo.”
Este breve esboço do homem revela a sua residência, condizente com o estatuto de capitalista, monárquico e, sobretudo, político influente. O seu assassinato, a 26 de junho de 1901, gerou grande repercussão nos jornais da época e está relatado na coleção de Sousa Costa, “Grandes Dramas Judiciais”. Este famoso caso judicial trouxe a Guimarães Afonso Costa, que viria a ser o futuro Presidente da República.
Francisco Martins da Costa, político e cidadão vimaranense de grande integridade e princípios, merece ficar na memória dos seus concidadãos, sobretudo pelo seu contributo à cidade. Destaca-se a instalação, na sua principal residência em Santa Luzia, da Casa de Agra, como sede de uma instituição cultural de prestígio, com tradições de intervenção cívica e cidadania, no coração do burgo.