O retorno do RPM
- ️Alexandre Nagado
- ️Tue May 14 2002
O maior sucesso do rock nacional dos anos 80 está de volta
O grande boom do pop-rock brasileiro que aconteceu na década de 80 consolidou um movimento musical que misturava influências new-wave, punk e technopop para criar a trilha sonora daquela geração. Enquanto muitos nomes daquele tempo nunca pararam, como os Titãs, Paralamas, Kid Abelha, Ira! e outros, alguns caíram no esquecimento e outros saíram de cena, mas conseguiram voltar aos poucos. Este é o caso de Capital Inicial, Kiko Zambianchi e agora - quem diria? - o RPM. Tendo sido a coisa mais próxima de uma beatlemania tupiniquim, a febre pelo RPM dominou a mídia daqueles anos como nunca havia se visto antes. Músicas tocando toda hora e em todas as rádios, shows por todo o país, clipes e entrevistas em todos os canais enquanto meninas histéricas gritavam por seu ídolo Paulo Ricardo onde quer que a banda passasse. Quem foi adolescente naquela época sabe bem do que estou falando.
A HISTÓRIA DA REVOLUÇÃO
Formado em 1984 pelo crítico musical Paulo Ricardo (baixo e voz), junto com Luiz Schiavon (teclados), Fernando Deluqui (guitarra, violão e vocais) e P. A. (Paulo Pagni, bateria e vocais - integrado em 1985), o RPM - Revoluções Por Minuto - foi a banda mais popular daquela década. Seu single de estréia, a empolgante Louras geladas saiu no final de 1984 e foi a porta de entrada para o estrelato. Outras pérolas foram lançadas, como Rádio pirata, Olhar 43, A cruz e a espada e Revoluções por minuto, também este o nome do primeiro álbum, de 1985.
Em 1986, veio o disco Rádio pirata ao vivo, registrando a mega-turnê dirigida por Ney Matogrosso. O disco vendeu mais de 2 milhões de cópias, algo inédito no Brasil daqueles tempos. Foram cerca de 270 shows em pouco mais de um ano, um fenômeno milionário sem precedentes. A ressaca regada a drogas, esgotamento físico e mental e crises de ego foi brava e o grupo quase acabou depois da turnê. Mas eles respiraram fundo e continuaram juntos por mais um tempo.
Dividindo mais a autoria das composições (outrora quase todas de Paulo Ricardo e Schiavon), o novo disco, chamado apenas de RPM (também conhecido como Quatro coiotes) foi lançado em 1988 e mostrou um clima mais sombrio e pesado. Isso afastou o grande público, que também estava cansado de ver o grupo em todo lugar. A superexposição na mídia e o desgaste interno acabaram fazendo ruir o sonho e o RPM acabou oficialmente em fevereiro de 1989.
A VIDA PÓS-RPM
Paulo Ricardo começou sua carreira solo ainda em 1989 e depois quis retomar a banda no início dos anos 90 junto com Deluqui e novos músicos recrutados. A coisa não deu certo e ele acabou investindo mais em sua carreira individual. Só voltou a fazer sucesso e a cair nas graças do grande público no final dos anos 90 com canções bem melosas.
Fernando Deluqui, depois de acompanhar Paulo Ricardo no início nos primeiros discos e shows solo e tocar um tempo com os Engenheiros do Hawaii, resolveu lançar também um trabalho solo em 2001. O clipe da boa música O fogo foi exibido na MTV, mas não teve grande repercussão.
Schiavon, depois do fim do RPM, tentou um trabalho pessoal, a banda Projeto S, mas não decolou. Acabou acertando a mão ao fazer trilhas para novelas da Globo, como O rei do gado e Terra nostra. E o batera P. A. tentou outras bandas e até uma carreira solo, mas não conseguiu apoio de nenhuma gravadora.
Passados tantos anos, o RPM era apenas uma lembrança na cabeça de quem viveu aquela época de ouro. Entretanto, embalados por uma grande onda de nostalgia (e chance de voltar ao estrelato), o RPM aparou as arestas, reorganizou-se e preparou um grande show de reencontro.
RPM 2002
Longe do clima intimista dos projetos acústicos, com seus violões e banquinhos, o álbum MTV_RPM_2002 é o registro do retorno de uma banda que sempre buscou um som vigoroso. No repertório, 17 músicas (mais uma faixa inédita de estúdio), entre regravações de sucessos do passado, covers e apenas umas poucas inéditas, como era de se esperar.
Marcado em várias faixas por uma desnecessária orquestra de cordas e metais, o especial teve um tom grandioso feito pra impor respeito logo de cara. E conseguiu, salvo um ou outro deslize que o grupo ainda vai corrigir. Afinal, foram doze anos sem tocar juntos. Exibido no último dia 10 de maio pela MTV, o show teve convidados ilustres, como Frejat (guitarra em Exagerado) e Otto (percussão em Naja, que ficou de fora do CD mas deve entrar no vídeo). Além dos hits obrigatórios, como Rádio Pirata (já regravada pelos Engenheiros do Hawaii) e Olhar 43 (que ganhou uma horrível versão fofinha pelo KLB), vale destacar a arrepiante Sete Mares, canção épica resgatada do álbum Os quatro coiotes. Tem também um caça-níqueis descarado, com a participação do além de Renato Russo. Em 1996, ele havia gravado com Paulo Ricardo um dueto belíssimo para uma nova versão de A cruz e a espada. O trabalho foi incluído no CD Rock Popular Brasileiro, o último da fase roqueira de Paulo Ricardo, antes de ele entrar de cabeça no brega (Desconfio que ouviremos lançamentos com a voz de Renato Russo por muitos anos ainda...). Entre as inéditas, tem a versão em português do tema do degradante mas popular programa Big Brother Brasil, prova de que a poderosa Globo não se esqueceu da banda que tanta audiência lhe deu no passado. Rainha e Carbono 14, canções da nova safra de composições, têm a cara do RPM clássico e mostram que muita coisa boa ainda pode vir do quarteto.
Se o retorno deste ícone da década de 80 vai dar certo, é cedo para saber. Todavia, num cenário musical tão carente de boa música, é um refresco e tanto ouvir o bom e velho RPM. Mesmo hoje, as antigas canções dos quatro coiotes ainda podem causar impacto e preparar o terreno para uma nova fase da carreira do conjunto. Autêntica ou não, a revolução continua.
Para saber mais sobre o som dos anos 80, leia o livro BRock - O Rock Brasileiro dos Anos 80, do jornalista Arthur DaPieve (editora 34)